Representantes do trade e especialista em turismo alertam para que modelo de concessão empregado pelo Governo Federal seja adequado para que a área não sofra degradação e tenha prejuízos nem econômicos nem ambientais
O Parque Nacional de Jericoacoara foi criado em 2002 com área de 8.416 hectares e, em 2007, teve os limites ampliados para 8.850 hectares, incluindo também uma faixa marítima com um quilômetro de largura, paralela à linha costeira
A menção a Jericoacoara pelo Governo Federal ao listar os parques nacionais que deverão ser privatizados é vista com atenção no Ceará. Da mesma forma que pode representar um avanço para o turismo, a exemplo de parques como o de Itaipu, a iniciativa corre o risco de degradar a área e tornar a exploração econômica um ponto negativo para a região, se mal planejada.
Para representantes do setor hoteleiro local, ainda é prematuro chegar a uma conclusão sobre que tipos de impactos a privatização do parque traria. O presidente da Associação Brasileira da Indústria de Hotéis (Abih) no Ceará, Eliseu Barros, pontua que as consequências dependerão do que virá junto ao pacote.
“Vai haver linhas de crédito, incentivo, capacitação? De que forma a comunidade vai se beneficiar disso? Ainda não dá para saber”, afirma.
O vice-presidente do Fortaleza Convention & Visitors Bureau, Régis Medeiros, também acredita ser precoce fazer qualquer tipo de julgamento. “Não podemos falar ainda sobre os pontos positivos e negativos, os prós e os contras”.
Na avaliação de Marcius Tulius Falcão, coordenador de Políticas Públicas do Turismo do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia do Ceará (IFCE), a parceria público-privada na região precisa ser estudada com todos os órgãos em nível municipal, estadual e federal.
“Essa ideia já é uma tendência, que possivelmente irá acontecer. Em 2014, já teve uma conjectura em relação a isso. A pretensão do Governo é tentar trazer mais estímulos a essas regiões. Mas não adianta conceder a administração do Parque para a iniciativa privada sem resolver os gargalos da região. E para isso, vai depender da mobilização do Município, Estado e Governo Federal e, principalmente, da comunidade. Já foram vistas obras lá que ficam paradas por anos na localidade. Tem que ser feito um estudo sério com a comunidade para que haja um planejamento participativo. Senão, não vai ser uma medida positiva”.
Superação de problemas
Sobre os gargalos, Falcão ressalta que há problemas de infraestrutura, insegurança e gestão na região. “Em estudos feitos em 2014, constatou-se que há falta de policiamento na região, tráfico de drogas, geração de subempregos (aqueles no qual não há necessidade de qualificação profissional), só na alta estação. Além disso, temos problemas na falta de fiscalização do trânsito dos veículos vindos das praias”, aponta, ressaltando que, sem fazer um estudo de viabilidade na região, considerando os impactos econômicos e ambientais, não adianta trazer concessões.
O secretário do Turismo do Ceará, Arialdo Pinho, por sua vez, assevera que o Parque Nacional de Jericoacoara ainda pertencem ao Estado do Ceará e nunca foram indenizadas pelo Governo Federal. Diz ainda que o Governo do Estado possui forte investimento para o desenvolvimento da região. "Tenho a certeza que pelo investimento que o Estado vem fazendo, juntamente com Prefeitura e com a comunidade da Vila de Jericoacoara, seria mais saudável para região e para o Ceará tocar o seu próprio destino. Temos estabelecido um projeto inovador no setor turístico brasileiro, temos metas ousadas e sabemos o caminho para onde queremos chegar".
Coloca ainda que a área sempre teve uma "gestão de baixa qualidade pela ICMBio", o que pode ter ocorrido por razões políticas. "Neste ano foi completamente desleixada. Tenho a visão que foi propositalmente, deixaram quase sem gestão, até por uma questão política para chegar a este momento", declara Arialdo Pinho.
Lista flutuante
Além da inclusão de parques nacionais e até presídios, o pacote de privatizações, que inicialmente previa a oferta de 17 companhias estatais, foi desidratado. Apenas nove companhias foram listadas dentro do programa: ABGF, Emgea, Serpro, Dataprev, Ceagesp, Codesp, Ceitec, Telebrás e Correios.
Para chegar a 17, o Governo citou a Lotex, que já passou por duas tentativas de leilão, a venda de ações do Banco do Brasil detidas pela União e seis estatais que já estavam no Programa de Parcerias e Investimentos (PPI).
Ao tentar explicar os dados trocados, o secretário especial de Desestatizações, Salim Matar, disse que houve “equívoco de informação” e que, na realidade, as 17 ofertas se referiam ao que está no “pipeline” do Governo. Prazos também não foram informados.
Boa parte dessas estatais é deficitária e não oferece atrativos. No caso dos Correios, a receita gerada pela entrega de correspondências está em franca decadência. O negócio da companhia é a entrega de mercadorias, o que o governo ainda não tem certeza se deve privatizar porque é lucrativo.
A Telebras, que também acumula prejuízos, ganhou fôlego com o lançamento de um satélite cuja capacidade é dividida com o Ministério da Defesa. Dificilmente esse ativo seria privatizado porque o governo conta com ele para levar adiante um programa de internet em locais de difícil acesso. Por isso, os técnicos envolvidos na preparação dos editais acreditam ser “muito difícil” vender essas estatais ainda neste ano. Conhecida como raspadinha, a Lotex tenta ser vendida desde 2018.
Avaliação positiva
A intenção de privatização de estatais do Governo Federal foi bem recebida pelo economista Célio Fernando. Segundo ele, o Estado precisa de uma reavaliação de tamanho para poder oferecer serviços de melhor qualidade para a população, e essa indicação, das 17 empresas que podem ser repassadas à iniciativa privada, representa isso.
“O Estado está muito inchado, atendendo oligarquias e, com isso, a sociedade não está sendo bem atendida. Nós temos uma democracia muito centralizada. Hoje, estamos sem condição de gerir tudo isso. Precisamos avaliar qual o melhor tamanho de estado para atender melhor o público”, disse Fernando.
Célio ainda comentou que as privatizações podem ajudar a União a recuperar os índices de crescimento do País, já que o Governo não teria mais a capacidade de investir em projetos para garantir o desenvolvimento econômico.
A opinião é compartilhada por Gilberto Barbosa, economista e sócio da Arêa Leão Consultoria. Ele ponderou que a agenda de privatizações do Governo Federal pode ajudar a atrair investimento de grupos internacionais.
“O impacto, no geral, é positivo e vem como coerente à agenda do Governo, e pode atrair investimentos, além de poder aumentar a concorrência nesses segmentos. Hoje, muitos desses negócios são tocados de um jeito muito ineficiente. Nada garante que eles serão gerenciados de forma eficiente, mas a iniciativa privada tem sempre essa perspectiva, de melhorar resultados”.
Cotações de estatais dispara na Bolsa
A promessa do governo federal de privatizar 17 estatais até o fim do ano fez as ações dessas empresas dispararam na Bolsa brasileira ontem (21). Além da lista que inclui Eletrobras e Telebras, a Petrobras também está nos planos de privatização. Tal expectativa se somou a um dia positivo para o mercado financeiro e levou o Ibovespa aos 101 mil pontos, alta de 2%.
As ações da Eletrobras abriram o pregão em alta de 2,6% e dispararam após a declaração do presidente da Câmara dos Deputados, Rodrigo Maia de que vai tentar votar o mais rápido possível o projeto de lei sobre a venda da Eletrobras, mas ressaltou que o empenho depende de o governo enviar nova proposta. Com a fala de Maia, os papéis chegaram a subir 14,4%.
Ao fim do pregão, os ordinários, com direito a voto, fecharam em alta de 12,6%, a R$ 45. Os preferenciais, de prioridade na distribuição de dividendos, subiram 10,8%, a R$ 44,61. Ambos n a máxima histórica. As ações preferenciais da Telebras, que também consta na lista do governo, saltaram 62%, a R$ 36,90, longe da máxima histórica de R$ 315,17 de 1997. As ordinárias dispararam 65%, a R$ 39,39, também distante do pico de R$ 399,80 de 2012.
Fora da lista, mas dentro das intenções do governo, a Petrobras e o Banco do Brasil tiveram fortes altas. As ações preferenciais da petroleira saltaram 5,95%, a R$ 25,45. As ordinárias, 5,7%, a R$ 27,90. Já os papéis do banco subiram 5,7%, a R$ 47,35.
Ainda nos destaques positivos Cyrela e MRV subiram 8% e 6%, respectivamente, após anúncio de financiamento imobiliário da Caixa, indexado à inflação.
Puxado pela Petrobras e BB, o Ibovespa teve alta de 2%, a 101.201 pontos, maior patamar em uma semana. O giro financeiro foi de R$ 18,2 bilhões, acima da média diária para o ano.
O bom desempenho do mercado de ações brasileiro foi impulsionado pelo dia positivo no exterior, que se recuperou das quedas da véspera. Londres subiu 1,11% e Frankfurt, 1,30%. Em Nova York, Dow Jones e Nasdaq subiram 0,93 e 0,90% respectivamente
Matéria de Diário do Nordeste.